Luciana Konradt

Personagens na praça

Por Luciana Konradt
Jornalista, advogada e escritora

Das leituras da adolescência, resgato Seis personagens à procura de um autor, de Luigi Pirandello. Impressionada com seu romance O falecido Matias Pascal, lido um pouco antes, ao me deparar com a narrativa para teatro, na qual seis personagens abandonados por seu criador buscam um diretor de teatro que lhes dê vida e visibilidade, fiquei muito curiosa. Li a peça toda em poucas horas.

Há no mundo literário uma grande discussão sobre quem domina a história: o escritor ou o personagem. Não pretendo aqui, entrar no mérito desse debate, mas sou, confessadamente, apaixonada por personagens. Mais do que a história em si, o livro, na maioria das vezes, fica gravado, em mim, a partir das peculiaridades da personalidade de cada um de seus protagonistas ou coadjuvantes.

Ao escrever, o ato de imaginar e dar voz a seres absolutamente fictícios é sempre solitário. Quando a história termina, porém, a mágica acontece e deixo de ser a escritora solitária para sentir-me rodeada de gente. A exemplo do diretor de teatro da peça de Pirandello, sou atormentada por esses entes incorpóreos. Para mim, o sofrimento termina quando, publicados, eles encontram seu lugar no mundo. Mas o verdadeiro encantamento só acontece mais tarde, quando o personagem encontra seu leitor. Só aí, a literatura tem sua razão de ser.

Hoje, para a nossa sorte, muitas formas de veiculação tornam a leitura acessível a todos. Mas o ato de folhear as páginas de um livro, na praça, entre tantos amantes da palavra, faz das feiras e festivais lugares de pura emoção; de absoluto deslumbramento. Festas como o 1º Festival Internacional Literário de Gramado (FiliGram), realizado em setembro, a 68ª Feira do Livro de Porto Alegre e a 48ª Feira do Livro de Pelotas, encerradas na última terça-feira, nas quais tive a alegria de participar como escritora, representam uma oportunidade para celebrar a vivência solidária e coletiva da escrita entre todos aqueles que organizam e participam desses momentos. Para reunir uma diversidade efervescente de autores que interagem entre eles e com seus leitores. Em eventos como esses, não consigo deixar de imaginar, também, que, sobre nossas cabeças, paira um outro grande encontro. Uma celebração dos multifacetados personagens das obras ali presentes. Alguns tristes, outros felizes; muitos rabugentos e resmungões, mas todos, sem exceção, desfilando emocionados. Encantados por encontrarem-se, enfim, entre árvores e ao som de pássaros, com as mãos carinhosas e os olhos ávidos de quem, ao final do processo da escrita, lhes empresta vida e sentido.​

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